V Cúpula da Cachaça: debate com produtores revela desafios e abre veredas para o futuro

Posted by | March 18, 2017 | Artigos | No Comments
Wilson Barros (Wiba-SP) fala. Milton Lima, Natanael Bonicontro (Companheira) e Jean Ponce escutam

Wilson Barros (Wiba-SP) fala. Milton Lima (cúpulo), Natanael Bonicontro (Companheira) e Sidnei Maschio (cúpulo) e Jean Ponce (Guarita) escutam

 

Por Dirley Fernandes

A quinta edição da Cúpula da Cachaça, no fim de janeiro, ficou marcada por uma inovação: a sessão aberta, com a participação de produtores e outros membros da cadeia produtiva da Cachaça.

Nas quatro edições anteriores, as sessões de discussão de temas relativos à cachaça eram restritas aos cúpulos. A ideia era promover um ambiente de troca franca de ideias e informações, que embasavam posicionamentos individuais e, sobretudo, coletivos. Esses posicionamentos eram espalhados pelos cúpulos durante todo o ano nas suas variadas atividades e, claro, divulgados nos canais de comunicação da Cúpula da Cachaça. Esse formato gerou muito conhecimento e uma atuação extremamente positiva da Cúpula como instituição e de cada cúpulo na valorização e conquista de espaços pela Cachaça.

Com a proposta de uma aproximação maior com a cadeia produtiva da Cachaça e na busca por uma atuação mais afinada de todo o setor na defesa de suas bandeiras e na identificação dos desafios a serem vencidos, resolvemos, no ano passado, convidar representantes da produção de vários estados, portes e visões de mercado para trocar ideias com os cúpulos durante a V Cúpula da Cachaça.

Tivemos uma resposta extremamente positiva e, no sábado, 28 de janeiro, sob um calor de 35 graus, estávamos reunidos numa grande roda na Cachaçaria Macaúva (Analândia-SP) para o debate ‘Cachaça, presente e futuro: os desafios’. Foram mais de três horas de uma discussão extremamente profícua, que apontou caminhos para a remoção dos entraves que dificultam a necessária ampliação do público do nosso destilado nacional.

Estiveram presentes os produtores Marcelo Nordskorg (Reserva do Nosco-RJ), Natanael Bonicontro (Companheira-PR), Roberto Brasil e Celso Lemos (Gouveia Brasil-MG), Carlos Eduardo Oliveira (Leblon-MG), Lucas Mendes (Tabua-MG), Alexandre Bertin (Sapucaia-SP), Wilson Barros (Wiba-SP) e Reinaldo Isaias da Silva (51), além de Carlos Lima (Instituto Brasileiro da Cachaça, Ibrac), Ilan Oliveira (ditribuidora Solution Comercial) e Jean Ponce (Bar Guarita).

Além deles, completavam a roda os 13 especialistas da Cúpula da Cachaça.

Tributação

Como de hábito, o enorme peso da carga tributária sobre a cachaça (calculada pelo IBPT em 81%) foi um dos temas mais discutidos. O Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), na pessoa de seu diretor executivo, Carlos Lima, informou sobre as complexas negociações levadas a cabo em Brasília para a adoção de uma alíquota mais factível para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), após o grande avanço que representou o retorno da Cachaça ao Simples. Lima lembrou que a defesa das demandas da indústria requer estratégias e perseverança. “O Simples foi uma negociação que se alongou por dez anos até que as circunstâncias se tornassem favoráveis para nós”, disse, demonstrando confiança de que novos avanços ocorram nos próximos meses.

Produtores como Wilson Barros (Wiba) e Marcelo Nordskorg (Reserva do Nosco) falaram sobre as dificuldades enfrentadas diante da alta e complexa carga tributária. “Temos que lutar para que isso mude. E mude rápido, porque do contrário, a sobrevivência do pequeno estará inviabilizada”, disse Barros, contando sobre as dificuldades dos primeiros anos de seu negócio. Bonicontro, da Companheira, se manifestou sobre as dificuldades encontradas pelos pequenos com a questão tributária, as dificuldades com a distribuição e se posicionou contra a exportação de cachaça a granel. “Cachaça produzida no Brasil deve ser engarrafada aqui”, defendeu. Outros presentes ponderaram que tal medida poderia prejudicar diversos modelos de negócios existentes e por estabelecer.

A ideia da mudança de taxação dos destilados para um modelo por volume de álcool também foi ventilada, mas uma série de inconvenientes foram apontados.

Roberto Brasil (Gouveia Brasil) e os cúpulos Manoel Agostinho, Nelson Duarte e Maurício Maia

Roberto Brasil (Gouveia Brasil) e os cúpulos Manoel Agostinho, Nelson Duarte e Maurício Maia

Informalidade

O tema da informalidade também esteve na mesa. Foram colocadas em discussão as diferenças entre o pequeno produtor familiar que necessita de apoio para enfrentar os desafios de uma produção legalizada e aquele que busca tão somente as vantagens de estar fora do ambiente legal de tributação.

Lucas Mendes (cachaça Tabua) lembrou que os processos burocráticos para legalização dos negócios é tão complexo que “o cara que produz pouco acaba se desinteressando”.

O tema da cachaça clandestina também foi debatido. Carlos Eduardo (Leblon) foi assertivo e, recordando o seu passado como extensionista, afirmou: “Não contem comigo para uma caça às bruxas contra o produtor clandestino”.

Carlos Eduardo e Lucas Mendes, da Tabua, contaram sobre a experiência de ambos, dando suporte a produtores informais de Patos (MG) e Salinas (MG), respectivamente, no sentido de prepará-los para, futuramente, alcançar a formalização.

Distribuição

Outro tema que teve destaque nas discussões foi o da distribuição, identificada como o principal gargalo no caminha da cachaça entre a porteira e a mesa do consumidor. Lucas Mendes (Tabua) contou sobre o trabalho que realizou em São Paulo, especialmente nas periferias, acompanhando a visita dos distribuidores para passar informações sobre a cachaça. “Conseguimos levar a Tabua para muitos pontos, andando por todos os lados diariamente, ao lado dos vendedores. Mas foi um trabalho pesado e ao longo de tempo, insustentável. Exige uma estrutura maior”.

Alexandre Bertin (Sapucaia) frisou o pouco conhecimento do distribuidor sobre o produto. “Ele não sabe o que é a cachaça, quais são as diferenças entre uma cachaça de produção mais restrita e um pouco mais cara. Só sabe e quer falar da questão comercial, do preço. É preciso trabalhar para levar o conhecimento sobre cachaça para esse distribuidor e trabalhar para desenvolver os canais de distribuição mais especializados. Mas tudo esbarra na falta de informação”, disse.

Presente na discussão, o distribuidor Illan Oliveira (Solution) contou que, na passagem do distribuidor ao varejista, o entrave maior é a informação. “Ainda subsiste o preconceito. A gente ainda precisa trabalhar muito para apresentar o nosso produto ao cliente. Ainda há muitos que acham que a cachaça não é um produto de primeira linha, que deva estar nas melhores casas”.

Cupula Sabado (30)

Lucas Mendes (Tabua) fala, tendo à direita Carlos Eduardo (Leblon) e Celso Lemos (Gouveia Brasil) e à esquerda os cúpulos Leandro Batista (na ponta), Cesar Adames e Dirley Fernandes (em pé)

Conquistando corações e mentes

Carlos Eduardo (Leblon) e Carlos Lima (Ibrac) pontuaram as melhoras no cenário. “Essa é uma discussão de dez anos. Mas o surgimento de espaços e instituições como a própria Cúpula da Cachaça mudaram o cenário de valorização do destilado. É outro mundo agora”, disse Carlos Eduardo.

O cúpulo Dirley Fernandes falou sobre as estratégias necessárias para a valorização da Cachaça. “Temos que trabalhar os conceitos e atributos que são os diferenciais da Cachaça: a ligação profunda com o Brasil, a autenticidade, a variedade, a organicidade, a excelência… São esses os diferenciais que podem levar a Cachaça a ganhar espaço de outros destilados. Temos que ganhar corações e mentes”.

Marcelo Nordskorg concordou, dizendo que “o produtor está sempre batendo na tecla da tributação e tem que ser assim. Mas é necessário divulgar a cachaça, para que ela seja vista como um produto de importância e de valor. “O papel da Cúpula é muito importante nesse sentido”, disse ele.

Carlos Lima, do Ibrac, lembrou do trabalho feito pelo instituto nesse sentido e da importância da regulamentação da Identidade Geográfica da cachaça, conseguida recentemente, para dinamizar esse trabalho no exterior.

Natanael Bonicontro (Companheira) pontuou que há dificuldades de acesso para os pequenos tanto em relação à distribuição quanto à chegada no mercado externo. “O mercado é protegido. Não conseguimos acesso”.

Nesse ponto da discussão, veio à tona as relações entre grandes produtores industriais e produtores menores. Celso Lemos, da Gouveia Brasil, fez um alerta importante. “Não podemos falar mal de outra marca de cachaça, como por exemplo, a industrial. Isso será lido pelo consumidor como uma restrição ao produto como um todo”.

O cúpulo Mestre Derivan fez uma revisão de várias iniciativas de divulgação da cachaça das quais participou, em parceria com marcas e distribuidores. E concluiu: “Quando a gente vende cachaça, tem que vender paixão. Isso que temos que passar para cada vez mais consumidores. A estratégia que todos temos que seguir é a de ampliar o público de apaixonados por cachaça. A Cachaça está aí. Todos vocês fazem produtos ótimos”, disse, se dirigindo aos produtores. “Agora, temos que nos unir para fazer com que essa cachaça chegue a mais pessoas”.

Carlos Lima (Ibrac), entre Marcelo Nordskorg (Reserva do Nosco) e Reinaldo Silva (51)

Carlos Lima (Ibrac), entre Marcelo Nordskorg (Reserva do Nosco) e Reinaldo Silva (51)

 

 

 

 

 

 

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